Nunca fiz nenhum feito extraordinário digno de
comentários alheios, nem tão pouco de manchete no telejornal das oito. Em miúda
nunca fui popular, nunca fui a mais bonita da escola, nem a mais inteligente da
turma. Quando tirei dezassete no exame final de história fui alvo de
contestação por parte dos meus colegas detentores de um QI superior ao meu.
Diziam eles e acreditava eu.
Em adulta desesperei para arranjar um namorado.
Nenhum homem gosta de um pau de virar tripas. Pensava, quando via no espelho a
minha figura esguia donde sobressaía um rosto, pequeno, não tão feio assim,
quase coberto por um emaranhado de cabelos que andavam por ali à solta, em desalinho,
tal como a minha vida, até ao dia…
Todos estamos aqui por alguma razão. Tudo tem uma
razão de existir. Cabe a cada um de nós procurar a nossa verdade. – Até ao dia…
Até ao dia em que certa noite li num dos meus
livros de auto-ajuda, que costumava ler sem convicção, estas frases feitas,
lidas e relidas centenas, senão milhares de vezes. Naquela noite, ligaram um
qualquer circuito que por defeito não veio ligado à nascença, ou foi desligado
pela mão da minha infância traiçoeira.
Não sou nenhuma heroína; nunca salvei ninguém de
morrer afogado. Não elevo ao apogeu milhares de fã; não sou cantora rock. Nunca
ganhei nenhum prémio, nem tão-pouco fui condecorada por feitos transcendentes. É
no dia-a-dia que me supero, quando retribuo amor, amizade e atenção. Supero-me,
quando digo “amo-te” à pessoa amada e às que não são amadas. Supero-me, quando preparo uma tarte para o meu amado.
Supero-me, quando chego a casa extenuada e é com prazer que brinco às
escondidas com o meu maior amor. Supero-me, quando me comovo a ver um filme e
choro qual Madalena arrependida. Supero-me, quando me olho no espelho e aprecio
o que vejo. Supero-me quando perdoo quem me
ofende.
Todos os dias contemplo a minha, a nossa, e a vossa
vida. Todos os dias dou, retribuo e agradeço, as pequenas coisas que fazem da
minha vida uma grande existência.